O grande salto
atrás
Cipriano
Justo
O ano de 2013 inicia-se com uma
garantia: o governo trocou definitivamente os portugueses pelo único objectivo
que, apesar de ser uma miragem, procura fazer dele a razão de todas as medidas
de austeridade incluídas no orçamento de estado, e aquelas que prepara para
tomar no quadro do que designou por refundação das funções sociais - o
salvífico regresso aos mercados em Setembro, mais precisamente no dia 23.
Para o governo é uma espécie de vale tudo, de jogar todas as
fichas numa derradeira jogada. O desemprego aumenta, não estivessem empregados.
As falências sucedem-se, paciência. Os despedimentos disparam, o que se há-de
fazer. O PIB cai, há-de crescer. A imigração regressa, boa viagem para os que
partem. A pobreza alastra, a caridade que cumpra a sua missão. Não tendo
conseguido, ao fim de dezoito meses de governação, cumprir nenhuma das metas
com que se tinha comprometido, resta-lhe o argumento com o qual quer fazer crer
aos portugueses que valeu a pena terem empobrecido. A bandeira do governo é
agora trocar de prestamista.
É verdade que nos últimos
três meses, principalmente desde a manifestação de 15 de Setembro, que se
desenvolveu e enraizou na população a consciência de que o governo tinha ficado
por sua conta. A dimensão da transversalidade da oposição às suas políticas,
traduzida na densidade nunca vista de manifestações, greves, concentrações,
petições, comentários, opiniões, é um sinal demonstrativo dos prejuízos
causados nas condições de vida de praticamente todos os portugueses, cujos
efeitos imediatos já se fazem sentir no plano individual, com as organizações
caritativas sem mãos a medir para os pedidos de ajuda, mas também com
implicações, no médio prazo, nos indicadores de desenvolvimento humano do país.
Se este é, sumariamente, o diagnóstico social da situação
portuguesa, faltam as respostas políticas que hão-de inverter esta situação. A
principal lição da intensa luta social presente durante todo o ano de 2012 é de
que não basta um coro imenso de protestos e manifestações de oposição para que
os dias deste governo cheguem ao fim. Mas, por outro lado, também não existem
condições políticas para uma solução à italiana, que fizesse uma espécie de transição
pacífica até às eleições de 2015. Com a actual composição da Assembleia da
República seria abrir querelas partidárias e inter-partidárias com
consequências imprevisíveis. Por essa razão, dar a voz aos portugueses será
sempre o caminho mais curto, e o único democrático, para resolver as crises
política, social e económica, que essas sim, há muito estão instaladas.
Interromper uma governação que está a colocar o país de pernas para o ar não é
abrir uma crise política é, principalmente, parar com os estragos que PSD/CDS
estão a causar. E parar, nas actuais circunstâncias, é a prioridade do momento.
Mas há uma condição indispensável para que os portugueses
ultrapassem a linha do protesto e invadam o território da alternativa. É
saberem qual é o bloco partidário que a irá liderar e qual é o programa
político que irá ser sufragado. Sem estarem claras para os eleitores estas duas
condições, o ano que agora começa até poderá redobrar de protestos quanto às
medidas deste governo, mas a lógica da aversão à incerteza irá sempre
prevalecer. Contando com o apoio maioritário dos deputados da Assembleia da
República, a confiança institucional do Presidente da República e o respaldo da
família partidária europeia, só uma oposição merecedora da confiança dos
portugueses é capaz de criar uma dinâmica social e política capaz de derrotar
esta coligação. Fora desse quadro, do género, cada um por si e depois logo se
vê, o risco é de serem os partidos do governo a encontrarem uma solução para
chegarem às eleições de 2015 em melhores condições de as disputarem do que as
actuais.
Dirigente da Renovação Comunista
Artigo de opinião publicado no jornal o "Publico" edição de hoje