É um pequeno livro que encerra imensa sabedoria. A tradução portuguesa, publicada pela Editora Objectiva, veio a público em Março do ano passado. Nessa altura, já tinha vendido em França um milhão e meio de exemplares.
Foi um autor de 93 anos quem escreveu
este manifesto veemente a coroar uma vida inteira dedicada à luta pelos
direitos humanos.
Stéphane Hessel nasceu na
Alemanha, mas refugiou-se em França com os pais, perseguidos pelos nazis. Naturalizou-se francês e tomou parte activa na Resistência, tendo sido preso duas vezes e
internado em campos de concentração alemães de onde se evadiu. Depois de
terminada a II Guerra Mundial, representou a França nas Nações Unidas e
participou na elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
No seu manifesto Hessel
recorda o programa aprovado há sessenta anos pelo Conselho Nacional da Resistência
francesa, o largo alcance social das medidas que preconizava e que foram
concretizadas nos anos seguintes, mas que são postos em causa e atacados na
Europa dos nossos dias. Pergunta porquê e responde:
«Apenas porque o poder do
capital nunca foi tão grande, insolente, egoísta, com servidores próprios até
nas mais altas esferas do Estado. Os bancos, agora privatizados, preocupam-se
principalmente com os seus dividendos e com os elevadíssimos salários dos seus
administradores, e não com o interesse geral. O fosso entre os mais pobres e os
mais ricos nunca foi tão grande.»
Por isso alerta:
«Os responsáveis políticos,
económicos, intelectuais e a sociedade em geral não podem desistir, nem
deixar-se impressionar pela actual ditadura internacional dos mercados
financeiros que ameaça a paz e a democracia.»
E depois previne:
«A pior atitude é a
indiferença, dizer «como não posso fazer nada, desenvencilho-me como posso»
Este tipo de atitude conduz à perda de uma das componentes essenciais do ser
humano. Uma das componentes indispensáveis: a capacidade de indignação e a
consequente militância.»
Mais ainda do que no ano em
que foi publicado, o apelo de Hessel à indignação tem plena actualidade no
nosso país. Crescem todos os dias razões fortíssimas para nos indignarmos – o
desemprego que alastra, a fome que se instala, os cortes de subsídios e de
salários, as colossais fortunas dos senhores que dominam o país, as vergonhosas
negociatas dos governantes, como a que se prepara na RTP – entre tantas outras.
Na lógica de Hessel, é
preciso que a indignação se transforme em militância.
(A edição portuguesa é
prefaciada por Mário Soares e está à venda nas livrarias.)
4 comentários:
Também já li e achei o máximo. Mas homens com essa fibra (e com a do Mário Soares, goste-se ou não dele) já não se fazem. Pelo menos cá em Portugal.
Pois é caro, Rodrigo. Como diz a Graça, políticos assim já não há...
Abraço
Tendo ontem colocado um video da Rita Rato é evidente que não que queixo de não haver hoje como os havia antigamente...
Depois há um aspecto que sistematicamente não se leva em linha de conta e ao que chamo a descontextualização da história. Por exemplo: contra o nazismo ou contra o salazarismo o odioso estava ali, o regime era claramente de ditadura e havia pouco lugar para maias tintas... hoje é bem diferente. Aponta-se o odioso às segundas, quartas e sextas e convive-se amigavelmente com ele às terças, quintas e sábados. Num ano está-se a dar lições na universidade do PSD, no ano a seguir está-se a prefaciar um livro de um resistente...
A indignação é um direito e um dever, Rodrigo.
Cada vez mais!
Aquele abraço
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